*Rede de Apoio Mútuo Anarquista – R.A.M.A
O histórico de criminalização da pobreza entendida como é hoje da perseguição política aos pobres, movimentos sociais, movimentos populares data do golpe militar que instalou a República no Brasil substituindo o império.
O sujeito “pardo, negro e índio” é na república taxado e tratado de “classes perigosas”. A estas condições de ordem racista são somadas a pobreza, a identidade geográfica para o caso de nordestinos e imigrantes trabalhadores ou não. Nesta sociedade patriarcal a mulher então tem a sua condição hiper-criminalizada desde o espaço público para o espaço doméstico com sua quase que total anulação socioeconômica.
Indivíduos e coletivos pertencentes a estas categorias e outras tantas como sem tetos, precarizados, gays, lésbicas, transexuais, ecologistas sociais, manifestantes de causas animais são criminalizados e perseguidos, presos condenados enchendo as prisões.
Um caso emblemático e exemplar da judicialização e criminalização das lutas e dos sujeitos das lutas que pertencem a estas chamadas “classes perigosas” é o de Rafael Braga Vieira: jovem trabalhador precarizado, em situação de rua, de familiares da periferia da cidade do Rio de Janeiro. Este foi preso, acusado e condenado por mais de cinco anos, com acusação infundada e provas materiais refutadas pela perícia técnica policial. Segue preso em regime semiaberto.
Dados atuais apontam para uma população carcerária de 711.463 presos, sendo deste total a população encarcerada de negros de 275 mil. Os dados são do próprio estado e podem variar pra mais. Destes presos a maioria está enquadrada nos chamados “crimes patrimoniais”, ou seja, relativos à propriedade privada e a maioria destes homens e mulheres negras está entre os 18 e 24 anos de idade.
Diante dos dados e considerando que estamos vivendo sob o regime capitalista, a criminalização está diretamente associada à propriedade privada e a negritude é certamente agravante racista que torna esta população a mais criminalizada, perseguida, presa e condenada.
De forma direta ou indireta os movimentos sociais, populares e sindicais são atuantes no debate, reformas e mesmo abolição da propriedade privada, um dos elementos fundadores da desigualdade e injustiça sociais. Isto torna suas organizações alvos de monitoramento e investigação policial permanente.
Das aldeias aos quilombos, dos campos às fábricas, das ruas às rodovias, dos morros ao asfalto, das florestas às cidades o capitalismo ao sentir-se ameaçado invoca as forças do estado: inicialmente a perseguição em locais de trabalho ou moradia, depois a força bruta, após isto a força das leis e dos magistrados, e por fim, não tendo o medo apaziguado pelo estado chamam os paramilitares para extirpar o “meliante” do convívio social.
No Brasil e no mundo vivemos este eterno cabo de guerra entre explorados x exploradores, oprimidos x opressores, desapropriados x proprietários. Movimentos como Associação Internacional dos Trabalhadores, Revolta dos Malês, Greve de geral de 1917, Revolução Espanhola, Ação Global dos Povos, Levantes de Junho de 2013, movimentos por terra, moradia, saúde, educação ou mesmo e apenas o fato de morar em uma periferia, em um morro, no campo foram e são considerados uma ameaça para governantes e capitalistas que vivem do esforço do trabalho de milhões neste nosso planeta, onde todos seus recursos hoje são explorados de forma absurdamente destruidora e para o benefício de poucos.
A criação de novas leis, a criminalização de manifestantes, movimentos sociais, populares, sindical associada à histórica perseguição de pobres, negros, índios, gays, lésbicas, transexuais e mulheres no Brasil conta com um novo momento a partir de 2013. Novos aparatos jurídico-policias foram somados a tradicional legislação da Lei de Segurança Nacional. Leis que parecem ser cômicas como a proibição de máscaras em manifestações são ligadas a leis mais duras como formação de quadrilha. Assim entendemos que nos encontramos num momento de ascensão reativa do estado contra as “classes perigosas”, estas mesmas classes não sendo mais dóceis se tornam uma ameaça.
Entendemos que o estado age novamente de forma a legalizar suas ações e atualizar a criminalização e perseguição que no Brasil é uma perseguição pelo crime político-jurídico de pobreza. A distinção é nítida ao observar o caso de Rafael Braga Vieira e dos outros 134 mil jovens negros da sua faixa etária que se encontram encarcerados país adentro, enquanto ladrões dos trabalhadores e dos recursos públicos estão a solta promovendo mais desigualdade e injustiça e alimentando com a carne do povo brasileiro sua fome destruidora e assassina.
Considerando o exposto acima a Rede de Apoio Mútuo Anarquista no Rio de Janeiro organizou no dia 01 de setembro de 2014 um fórum de diálogos e debates sobre a criminalização da pobreza, dos movimentos sociais, movimentos populares e sindical no Rio de Janeiro. Com isto abrimos com convidados e parceiros as possibilidades de luta e autodefesa para além da personificação das lutas, afirmamos a liberdade de pensamento e expressão, a liberdade de posição ideológica, a liberdade de manifestação, sobretudo a liberdade de batalhar por melhores condições de vida e de trabalho, a liberdade de lutar pelo fim das injustiças e desigualdades sociais.
Nosso objetivo foi alcançado com uma sala composta pela diversidade de sujeitos das lutas que a questão exige para ampliar os horizontes e estreitar laços para o trabalho e a luta cotidianas, estavam lá moradores e participantes de movimentos de comunidades e subúrbio da zona norte do Rio, integrantes de sindicatos, estudantes, coletivos políticos, pessoas em situação de rua.
Agradecemos a todxs os envolvidos na realização e apoio ao fórum e saímos certos de que é possível, através do entendimento, da reflexão, do diálogo e manutenção de uma rede de apoio mútuo construímos um mundo livre,
Organização:
Rede de Apoio Mútuo Anarquista.
Realização:
Rede de Apoio Mútuo Anarquista,
Núcleo Pró-federação Libertária de Educação.
Apoio:
Escola de Rua
Agradecimentos:
Liga Anarquista no Rio de Janeiro
Midiativistas:
Raffaella Moreira – fotógrafa
Alexandre Kubrusly – filmagem